
Por: Almir Moreira – Advogado
Mar revolto desde a chegada de embarcações (caravelas)
comanda por europeu na terra de Pindorama, depois rebatizada virou Brasil. A
tranqüilidade e a claridade das águas repentinamente se viram modificadas,
turvaram e se encresparam. As embarcações do velho mundo as agitaram.
Bugigangas nunca vistas, vestimentas extravagantes e adornos suntuosos causaram
no primeiro momento espanto e admiração.
Mal sabiam os nativos que dentre em breve do bucho das
caravelas corruptelas de todo naipe seriam paridas. Mal sabiam os donos das
águas cristalinas, que logo,logo veriam suas filhas se deitarem levianamente
com os marinheiros, seriam obrigados a derrubar mais de 50 milhões de toras de
pau Brasil e, o pior, seriam governados sob costume e lei nada tupiniquim. Suas
canoas estavam condenados diante do mar revolto provocado pelo singrar das
caravelas. Só um registro prá não esticar muito, o primeiro Ministro da Justiça
vindo em embarcação portentosa foi um tal Pero Borges, político desembargador
condenado nas terras do velho mar de onde partiram as caravelas. Esse sujeito
cumpria pena por encarregado de supervisionar como corregedor de justiça a
construção de um aqueduto em Elvas, no Alentejo. Desviou quantia
fabulosa na época lá no velho mar. Pois bem, antes de cumprir sua pena ganhou o
cargo de ouvidor-geral no Brasil. Podia condenar a morte, índio, escravo, peões
e cristão livre. Começou aí a transposição de parte de nossa herança, veio
nessas caravelas.
Felizmente, nelas vieram também sua antítese, gente de bom
caráter e de boa intenção, gente como os que constituiam a Companhia de Jesus,
por exemplo. Vieram juntos mas não se misturaram, embora alguns sob o mesmo
juramento tenham se misturado com os sujos na barriga das embarcações; que o
diga o Bispo Sardinha e o Padre Fernão Pires, ambos acusados de corrupção e
este último assassino confesso.
Foram nessas águas que fomos formados, foram nelas que fomos
moldados, anos e mais anos se sucederam, e essas embarcações portentosas
singraram livremente nossos mares. Deixando-nos um mar de dejetos, lama e
podridão, que só agora inspirado pelos ensinamentos da antítese vinda nas
caravelas, companhia de Jesus, por gente do calibre de padre Antonio Vieira,
por exemplo, começamos a dar os primeiros passos para romper esses grilhões da
cultura do autoritarismo e do patrimonialismo.
Falta muito para nossas águas serem despoluídas, para que
nossas embarcações possam singrar sem sacolejos, mas as primeiras remadas já começamos
a dar. Não tem mais volta. Só o fato de remarmos livremente já é um grande
começo.
Denunciar por denunciar é denuncismo e denucismo nunca
aponta a nada, nunca é critico. Se só temos no momento duas embarcações para
viajar por uma delas teremos que optar, certamente uma delas singra mais
segura, uma delas inevitavelmente romperá o resto do mar revolto, mesmo a
contra gosto, assim como os ensinamentos da Companhia de Jesus, de Antonio
Vieira, Dom Elder Câmara e tantos outros germinaram este mar mais livre pelo
qual navegamos hoje.
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